*Flávio Porcello
Pode parecer paradoxal: quanto mais espaço existe para noticiar, menos notícias há para dar. Falo de qualidade e não de quantidade. A tecnologia moderna acabou com as distâncias e encurtou o tempo. Hoje é possível falar de qualquer lugar do mundo para qualquer outro ponto do planeta. E até do espaço.
Mas fala-se para dizer o quê?
Espaços há de sobra: o que falta é conteúdo para preencher esses espaços. É oportuno citar o inglês John Thompson para lembrar que os governos autoritários calam a imprensa. Mas essa não é a única causa para censurar a informação: Uma explicação mais satisfatória das condições institucionais da liberdade de expressão no final do século XX deve levar em consideração de que tal liberdade está ameaçada não apenas pelo exercício irrestrito do Poder pelo Estado, mas, também, pelo crescimento desenfreado das organizações da Mídia no campo privado (THOMPSON, 1995:327).
O jornalista espanhol Xavier Mas de Xaxàs assinala queA las noticias les sobra ideologia y les falta originalidad y precision. (...) Por que las noticias son tan similares? Será porque todas reflejan la verdad, y verdad no hay más que una? No seria más lógico caer em la cuenta de que lãs noticias coinciden porque han sido producidas em fábricas que han optimizado al máximo la cadena de montaje? No hay tanta diferencia entre la concepción, producción, comercialización y consumo de um coche y uma notícia (XAXÀS, 2005:43).
As citações dos autores europeus são utilizadas aqui para reforçar o conteúdo trazido por Dornelles e Biz no recém lançado livro Jornalismo Solidário. A obra assinala, também, que, como a Mídia eletrônica é uma concessão de serviço público, a sociedade deve saber quem são os permissionários e quando se esgota o prazo da concessão. Mas essas informações não são facilmente disponibilizadas ao público. Dizem os autores: “Cidadania significa, também, ter capacidade de ler a Mídia e de questionar suas estratégias, de modo a não repetir pura e simplesmente o que ela conseguiu transformar em senso comum” (DORNELLES & BIZ, 2006:45).
O livro constitui-se em importante contribuição para quem trabalha ou estuda a Mídia contemporânea e sua influência social. É importante saudarmos a expansão da Mídia mas é preciso, também, questionar e fiscalizar criticamente esse crescimento.
O jornalismo é pratica de mediação discursiva. Existe para nos contar o que aconteceu, como e porque aconteceu. Mas, sem dúvida, quem conta o que vê, conta sua visão do que viu. Há lentes e filtros ideológicos que determinam escolhas e recortes na produção e veiculação de notícias. Quanto mais procuramos a verdade, mais encontramos a verdade que querem nos mostrar.E o livro Jornalismo Solidário traz excelentes recursos para ajudar-nos não apenas para “ler” mas, também, “enxergar” o que a Mídia nos mostra.
Fiz as citações dos quatro autores acima e seus livros para agora introduzir a questão que considero central no debate: a importância do diploma para exercer o bom jornalismo. Além dos autores acima citados poderia escolher centenas de outros autores e seus livros. Mas fiz uma escolha. Jornalismo é isso. É escolher, recortar, resumir a informação que será transmitida. Nós, jornalistas, somos mediadores entre o fato que virou notícia e o público que será informado.
Qualquer um pode fazer isso? Claro que não. Muitos dizem que sim. Aliás, quanta gente gosta de se fazer passar por jornalista. Mas é fundamental que a profissão seja exercida por quem se qualificou para isso. Sou jornalista há mais de 30 anos, com passagem em diversas redações de jornais e TVs do Brasil. Sou professor de jornalismo há 15 anos, em universidades públicas e privadas. Mas não pensem que estou defendendo o diploma por uma questão de reserva de mercado. Nada disso. Eu mesmo testemunhei em várias redações por onde passei gente desqualificada e oportunista querendo exercer a função de jornalista, sem qualificação para tal. Os resultados sempre foram desastrosos. Principalmente para quem recebe a informação.Quando o leitor está comprando um jornal ele está exercendo o seu direito de ser corretamente informado por quem se qualificou para informá-lo da melhor maneira possível. E do profissional jornalista deve-se exigir, além do diploma, uma conduta séria, baseada na honestidade e nos princípios éticos que norteiam nossa profissão.
Imparcialidade? Bem essa é difícil de atingir. Por trás de qualquer imagem está o olho do jornalista. Ele faz o recorte, faz a escolha, decide o que vai mostrar. Logo, ele não é imparcial. Ele tem lado, escolheu uma posição para dali fazer sua observação. O jornalista não pode ser imparcial, mas deve ser honesto. Deve ter a determinação de mostrar o máximo possível do que apurou para o público consumidor da notícia faça sua avaliação.E essa é uma atitude que exige conhecimento, capacidade de discernir, de separar os fatos banais do cotidiano daqueles que efetivamente vão virar notícia.Faço assim, a defesa intransigente da exigência do diploma para o exercício da profissão de jornalista e recorro aqui ao que diz Mino Carta sobre o assunto:Do profissional de comunicação exige-se honestidade. Na Mídia nativa, a alegada busca da imparcialidade e da objetividade serve apenas como adubo da hipocrisia. Jornais, revistas, meios de comunicação em geral, apóiam o Poder pelo simples fato de que fazem parte dele, são seu instrumento. Ou, por outra, apóiam a si mesmos, sem qualquer preocupação quanto à honestidade (CARTA, 2002:18).
Com a citação de Mino Carta, um exemplo aos jornalistas brasileiros, encerro essas breves linhas, reiterando minha convicção absoluta de que só teremos um Brasil melhor se cada um fizer adequadamente o seu papel. E a Imprensa é fundamental nessa reconstrução. Só teremos uma Imprensa forte, que ajude o país a encontrar seu rumo, se ela for exercida por profissionais qualificados (e diplomados!). Ética aprende-se na escola, sim. E é lá nos bons cursos de jornalismo que continuarão a ser formados os verdadeiros jornalistas brasileiros, preocupados cada vez mais em dignificar nossa nobre profissão.Afinal, a vida sempre nos surpreende com algo que não fora previsto. E o sentido que nós damos às coisas é o que vai dar uma ou outra direção à vida. A Viagem é o espaço compreendido entre o “onde estamos” e o “para onde vamos”. O caminhante faz seu caminho. E a estrada muda conforme o olhar de quem está viajando.Nós, jornalistas, temos esse papel. Vamos conduzir a informação precisa, exercer a fiscalização crítica, provocar inquietação, levantar questões, enfim, instigar. E assim estaremos dando nossa contribuição para a construção de um país melhor para todos nós que vivemos nele e para os que nele vierem a viver.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARTA, Mino. Carta Capital. Ano VIII, nº 209, de 02/10/2002, p.18
DORNELLES, Beatriz & BIZ, Osvaldo. Jornalismo Solidário. Porto Alegre: GCI, 2006.
THOMPSON, John – Ideologia e cultura moderna – Teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. Petrópolis: Vozes, 1995.XAXÀS, Xavier Mas de. Mentiras – Viaje de um periodista a la desinformación. Barcelona: Ediciones Destino, 2005.
* Jornalista e advogado, Mestre e Doutor em Comunicação. É professor de jornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É autor dos livros: No ar: TV Universitária – limites e possibilidades (Edipucrs, 2002) e Telejornalismo: a praça pública da atualidade (Insular, 2006)
Texto retirado do site da Fenaj
www.fenaj.org.br
1 comment:
Bom dia.
Meu nome é Aurélio Martins Favarin e sou Relações Públicas pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).
Gerencio o blog TCC Comunicação (www.tcccomunicacao.blogspot.com). O espaço é destinado à publicação de resumos de tccs de graduação e pós-graduação, dissertações e teses na área de comunicação. Em 2008 o espaço contou com a publicação do resumo de: 17 tccs de graduação, 4 tccs de pós-graduação, 4 dissertações e 1 tese.
Mensalmente o espaço oferece um livro de comunicação para o trabalho eleito como mais interessante pelos usuários do espaço.
Escreva o resumo do seu trabalho, com aproximadamente 1.500 caracteres (com espaço), para o e-mail aurelio.favarin@gmail.com.
Atenciosamente,
Aurélio Martins Favarin
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